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A cachaça no imaginário morretense

Trabalho apresentado a disciplina de Antropologia do Curso de Psicologia.

Prof° Gilberto Gnoato

Equipe: Liomar Furquim
Márcia Regina Skorupa
Mariana Betta Lobato
Paola Schubert
Rafaela Celinski
Sophia de Lima Chessio
Stephanie Consentino

 

 

1 – DISCUSSÃO TEÓRICA


     Com o auge da produção de açúcar em todo o Brasil foram decretadas as implantações de engenhos centrais em determinados pontos do país. Um destes foi introduzido na cidade de Morretes.O engenho central de Morretes foi implantado na Colônia Nova Itália, com o apoio do poder público, (pode contar com a quantia inicial de 100 contos de réis destinada ao seu engenho). Estabelecido um contrato com os colonos da nova Itália estes deveriam produzir a cana e vendê-la somente ao engenho central (BORGES, 1984).
     Descontentes com o baixo preço que recebiam pela cana-de-açúcar e por considerar o trabalho quase que escravo decidiram suspender a venda de cana ao engenho central e pediram a construção de um engenho de aguardente, pois a colônia possuía estrutura para o tal. Foi assim que surgiram os engenhos de alguns imigrantes. A decadência do engenho central iniciou-se com a morte do seu dirigente, e com a visita de D. Pedro II que questionou a qualidade da cana do nosso litoral. Daí para frente passou a depender da ação empreendedora dos italianos que inicialmente dedicaram-se a produção de aguardente (BORGES,1990).
     Os pequenos produtores de aguardente começaram a concentrar-se por toda a região, a maioria ao redor do Anhaia e ali instalaram-se e desenvolveram seus alambiques passando a produzir a famosa cachaça morretiana. Nessa época, Morretes, possuía por volta de 40 engenhos de aguardente e sua cachaça foi se popularizando por todo o país, representando a grande parte da economia da cidade e influenciando diretamente na cultura dos nativos. Mesmo com uma forte influência econômico-cultural os engenhos de aguardente também não resistiram a falta de mão-de-obra, de água, altos impostos, passando a dedicar-se a novas culturas (maracujá e gengibre) (BORGES,1990).
     Hoje a cana é praticamente extinta em Morretes, e seu nome utilizado para rotular as cachaças vindas de São Paulo. Mesmo com uma excelente geografia e com sua cachaça já considerada uma das melhores do Brasil, toda a história e o engenho morretense estavam sendo totalmente perdidos, mas graças a implantação de novos projetos e grandes perspectivas, hoje há uma visão de reciclagem e desenvolvimento da “velha cachaça morreteana” (SCUCATTO, 2001).

A cachaça como cultura e elo de integração

     “Em Morretes, cachaça não é droga. O conceito de droga é muito mais amplo que a sua farmacologia e não está limitado apenas aos parâmetros biológicos. Fato é que ao desprender a droga de um conceito orgânico, remete-se sua discussão aos parâmetros sociológicos e culturais” (GNOATO, 2001).
     “As drogas produzem um efeito de exclusão social, e desintegração cultural, droga não faz parte da nossa cultura. O que caracteriza a microrregião do litoral paranaense é justamente o seu caráter relacional, todos se relacionam com todos e com certeza quando é preciso "quebrar o gelo" de uma visita inesperada, nada melhor do que a magia de um bom gole de cachaça para relaxar qualquer tipo de frieza” (GNOATO,2001).
     “Não se pode perder de vista que a cachaça é um forte elemento cultural da nossa região. Se a função da cultura é estabelecer um elo de ligação entre os indivíduos, é pela cachaça que se chega a uma conversa saudável. Depois, fuma-se um palheiro, bebe-se mais uma pinga e toma-se um cafezinho. Este é o ritual da solidariedade morretense, porque em Morretes, cachaça não é droga” (GNOATO, 2001).
     Ali se reúne uma variedade de pessoas, cada grupo com seus costumes. É a turma do futebol do sábado. Ao menos eles dizem que jogam bola. Pouco mais adentro, na ponta de entrada do balcão, ficam aqueles que gostam de estar entre o público e o privado. Normalmente são eles os mais simpáticos. Amigos de quem passa pela rua e de quem entra no bar. A parte central do balcão fica para o atendimento daqueles fregueses que não bebem muito. É a parte neutra do estabelecimento. A ponta dos fundos, já em meio a uma certa penumbra, é o lugar da reflexão. É a parte privada do bar. Ali se concentram os críticos. Não fazem questão de serem cumprimentados pela exterioridade, já que suas conversas estão voltadas para dentro (GNOATO, 2001).
     Neste lugar eles destituem o presidente, assumem a prefeitura e transam com as mulheres mais bonitas da cidade. Normalmente eles estão de costas para fora. Não querem saber do mundo, ou melhor, não vivem o mundo. Lá pelas tantas, acabam todos abraçados na garrafa. Ir a este bar, não deixa de ser uma aprendizagem antropológica. É um verdadeiro ritual, pois todos os dias, no mesmo horário, lá estão as mesmas pessoas com as mesmas conversas. Através da repetição, os ritos servem para reforçar o comportamento social e os costumes de uma cultura. Para que melhor do que samba, cachaça e futebol (GNOATO, 2001).
     Segundo GNOATO (2001), que particularmente vem desenvolvendo um importante trabalho de resgate e conscientização cultural na cidade de Morretes, a sociedade morretense iludida com o falso desenvolvimento está deixando perder seu grande valor histórico-cultural. Os engenhos para muitos, hoje não passam de um fato histórico que perdeu-se em ruínas. Entretanto toda sua contribuição cultural e perspectiva econômica deixada por eles, estão presentes nas casas através de quadros, artefatos e na memória dos nativos, nos quais os engenhos desencadearam toda sua cultura que deixou marcas. Hoje a cana é praticamente extinta no município de Morretes e seu nome utilizado para rotular as cachaças vindas de São Paulo. Mas graças a um grande trabalho que vem sendo desenvolvido na cidade há possibilidade de ocorrer o resgate da cultura e a conscientização da verdadeira importância, não só dos engenhos e seu produto, mas de toda a história da cidade que não pode deixar para trás seus vestígios culturais e tradição, devido ao inserimento de uma modernidade ilusória.

2 – QUESTÃO DE PESQUISA
     A representação social da cachaça nas famílias tradicionais produtoras de aguardente, comparada à representação social da cachaça nas famílias de novos produtores de aguardente do município de Morretes.


3 – RELEVÂNCIA OU JUSTIFICATIVA

     O Governo Federal nos últimos anos incentivou o plantio da cana-de-açúcar. Esta estaria designada, não só para a fabricação dos produtos básicos extraídos da cana, como álcool e açúcar, mas também para a produção de aguardente. Visando restaurar o nome já obtido pela aguardente em todo o Brasil, o Governo Federal lançou uma lei para motivar os produtores a voltarem a produzir.
     Diante disso a história da cachaça se refaz, apontando para algumas regiões brasileiras que tiveram principal destaque, como por exemplo, em Minas Gerais, onde a tradição da cachaça já é reconhecida em todo o Brasil. Morretes, dentro desse contexto, apresenta-se como um dos promissores produtores de aguardente. Segundo Maurício Scucatto, produtor e morador da cidade, a amostra de aguardente de Morretes foi apreciada por um conselho existente em Minas Gerais, que considerou-a a 2ª melhor cachaça do Brasil.
     O presente trabalho partiu do princípio que Rocha Pombo no governo, em que foi Deputado Estadual (1912), auxiliou os produtores da cachaça em Morretes, que tinham na época mais de 40 engenhos de aguardente, e produzia cachaça para todo o país. Morretes tornou-se a “terra da cachaça”, sendo o principal ponto de referência quando ratava-se de aguardente.
     Buscando a história da cachaça morreteana e todas as vicissitudes a que ela foi submetida, pretende-se trabalhar a situação atual e as perspectivas dos novos produtores.
     Daí a importância do estudo, considerando que a produção da cachaça de Morretes não é apenas um fator de recuperação econômica, mas um fator de recuperação identitária, já que a aguardente recupera as referências ancestrais de toda uma época e um lugar.

4 – PRESSUPOSTOS
     Pressupõe-se que existam duas forças atuando sobre a cachaça morreteana. A primeira seria a força econômica, mostrando o vestígio de toda uma história, de onde Morretes vivia sob uma potencialidade financeira. E a segunda, viria de uma força com conotação cultural, de unidade social, uma vez que a aguardente está presente como um elo de ligação entre os indivíduos, pela tradição e o pelo seu sentido simbólico, que se faz presente entre os morretenses.
     Através de um trabalho realizado no ano de 2001 para disciplina de Antropologia Social e Cultural, sob orientação do professor Gilberto Gnoato, e deste trabalho também, orientado pelo referido professor pressupõe-se que a aguardente esteja visivelmente inscrita no imaginário morrentense, por ter sido Morretes já Ter sido uma das maiores produtoras de aguardente, chegando ser conhecida como a “terra da cachaça”.


5 – OBJETIVOS

5.1 Objetivo Geral
· Focalizar a representação social da cachaça nas famílias tradicionais morretenses e as perspectivas dos novos produtores.
5.2 Objetivos Específicos
· Identificar novas perspectivas e visões no imaginário morretense, com a retomada da produção de aguardente no município.
· Identificar a presença dos vestígios culturais da cachaça nas tradicionais famílias produtoras de aguardente, buscando artefatos, documentos e outros vestígios que representem culturalmente a simbologia da cachaça no universo morretense.


6 – METODOLOGIA


     Este trabalho foi realizado com a utilização, da observação participante. Como instrumentos foram utilizadas aplicações de questionários. A construção do questionário e definição das perguntas que seriam utilizadas foram extraídas de um projeto piloto, dividido em duas categorias:
     Produtores tradicionais e novos produtores de cachaça em Morretes formaram as categorias necessárias para a realização do projeto piloto. Perguntas referentes à representação social da cachaça dirigida aos produtores em seus alambiques foram suficientes para a coleta dos dados necessários e para a construção das perguntas posterior para a pesquisa em si, que fizeram parte do questionário.
     A aplicação do questionário de pesquisa destinou-se a três categorias distintas: turistas, estudantes do Ensino Médio, residentes na cidade de Morretes e adultos acima de 45 anos, também moradores de Morretes. Foram preenchidos 80 questionários com turistas, 80 com estudantes do Ensino Médio e 80 com adultos acima de 45 anos, num total de 240 questionários. Os turistas foram abordados no SESC (Serviço Social do Comércio), pelos funcionários do setor de turismo, momentos antes de uma excursão ao litoral paranaense. Os jovens, estudantes do Colégio Estadual Rocha Pombo, da cidade de Morretes, preencheram o questionário nas salas de aula com o direcionamento da coordenadora do colégio. Os adultos foram abordados nas ruas e no comércio de Morretes pelas integrantes da equipe.
     O processo de investigação, que consistiu na elaboração de um projeto piloto, entrevistas, observações frente aos artefatos existentes, deu suporte suficiente para a construção e aplicação de questionário, tornando possível à realização da análise de dados, essencial para a conclusão do trabalho.

7 – ANÁLISE DOS DADOS (clique nos links abaixo para acessar)

1 Questionário aplicado a jovens estudantes do Ensino Médio que residem na cidade de Morretes

2 Questionário aplicado a adultos acima de 45 anos, moradores da cidade de Morretes

3 Questionário aplicado a turistas da cidade de Morretes

8 - CONCLUSÃO

     Morretes, como o próprio nome expressa, é uma cidade rodeada de morros, aos quais caracterizam sua beleza natural. Já chamada de Menino Deus dos Três Morretes, a cidade é repleta de belezas naturais, cultura e tradição.

     Pode-se comprovar que a valorização da imagem paisagística está introduzida não só no dia a dia das pessoas, mas faz parte da concepção ideológica de cada um, principalmente nos jovens, que através da primeira questão (aberta) do questionário, preocuparam - se em evidenciar a importância que designada a natureza local.

     Engajados pelo momento político, vivenciado no período da aplicação dos questionários, muitos manifestaram seu descontentamento e a preocupação pela falta de emprego na cidade, apontado números significativos, comentados nas análises dos dados.

     A tranqüilidade, fator mais evidenciado pelos adultos, que vivem na cidade, parece estar ameaçado, quando o assunto é aguardente. Devido a decadência vivida pela cachaça, esta estava perdendo-se no tempo juntamente com sua estória e tradição, fazendo com que os moradores, principalmente adultos ficassem sem uma boa referência em relação a cachaça, restando o pensamento de que ela não recupera nada e principalmente direciona os jovens, muitas vezes seus filhos e netos, para o "mal" caminho. Entretanto quando fala-se sobre a venda da cachaça, a grande maioria prefere apenas fazer a divulgação nas cidades próximas e com o tempo no Paraná, mostrando a preocupação em preservar seu produto dentro do estado.

     Os turistas por estarem envolvidos pelo dia - a - dia das grandes cidades, acreditam que a melhor opção é a exportação, evidenciando a influência que elas ,as grandes cidades exercem sobre os indivíduos e grupos que nela atuam. Com os processo de globalização em que o mundo está aderindo e o livre comércio de seus produtos, sempre em busca de recursos econômicos, ou seja, visando o lucro torna-se evidente a preferência pela exportação já que este seria um método mais rápido e fácil para atingir os objetivos.

     Conhecida como "terra do barreado", em Morretes este fato não se comprova, não por não ofertarem a comida típica, pois esbanjam de restaurantes e boa comida, entretanto, os jovens e adultos entrevistados, moradores da cidade, não lembram de barreado quando perguntamos sobre a primeira coisa que lhe vem a cabeça quando o assunto é Morretes. Em contrapartida eis que surgem os turistas que entre os 80 entrevistados, um pouco mais que a metade lembra-se de Barreado, mesmo que nunca tenha experimentado ou ido até a cidade, conforme nos foi relatado no momento da pesquisa.

     Enfim com o contínuo desenvolvimento do trabalho de pesquisas e as entrevistas que definiram a elaboração do questionário aplicado, foi possível comprovar que por de trás da resposta de cada um existe um pano de fundo que caracteriza toda a história e pontos principais da cidade de Morretes, e que mesmo inconscientemente as pessoas demonstram essa internalização de uma cidade rodeada por tradição cultura e ao mesmo tempo a modernidade.

 

9 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BORGES,L. O Marumbi por testemunha. 18°ed. Paraná: O formigueiro, 1984.

BORGES.L. A Imigração Italiana em Morretes. Paraná: O formigueiro, 1990.

GNOATO, G. Citação de referencial e documento eletrônico. Disponível em http://www.morretes.com.br.