DE RIOS E MATAS
Paulo de Tarso Barreto de Faria*

Rio bom é rio morto; de preferência canalizado e pavimentado em cima, de forma que nada lembre que ali houve um. É triste mas parece que é assim. Já vão longe os tempos em que Fernando Pessoa ou Alberto Cardoso - o grande menestrel morretense que tive a sorte de conhecer - cantavam os rios de suas aldeias; que cidades eram conhecidas e admiradas pelos rios que as banhavam. Certamente, hoje, Guimarães Rosa não diria pela boca de Riobaldo, em rompante de heterodoxia, 'eu bebo água de todo rio'. Em quase toda parte, rio é agora sinônimo de esgoto e está associado a destruição, doenças, mosquitos e uma enorme variedade de coisas ruins.
A destruição de um rio geralmente começa pela destruição das matas que o margeiam e protegem, as chamadas matas ciliares. Sem elas desaparecem os peixes que delas se alimentam e que por sua vez servem de alimento a outros peixes. Desaparecendo os animais que as habitavam e aumentando a incidência de sol sobre as águas, pragas como o borrachudo e a lagarta venenosa proliferam. O solo, que com sua cobertura vegetal absorvia as águas das chuvas e segurava toda espécie de materiais, agora escorre para o leito dos rios, levando o veneno das lavouras, assoreando-o e causando enxurradas. Nessas condições, é quase um milagre que a vida insista em se manifestar.
Por incrível que possa parecer, há um Código Florestal no país que, no seu artigo 2º, considera as matas ciliares áreas de preservação permanente, observados os seguintes limites: 30 metros de cada lado dos cursos d'água com menos de 10 metros de largura; 50 metros de cada lado dos cursos d'água com largura de 10 metros até 50 metros e assim progressivamente; nas nascentes e olhos d'água, num raio mínimo de 50 metros; ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios de água, naturais ou artificiais (Lei nº 4.771, de 15.09.1965 alterada pela Lei nº 7803, de 18.07.1989). Pasme, leitor, mas esses limites são válidos também para as áreas urbanas! Imagine como nossas cidades poderiam (podem) ser lindas e agradáveis (além de sadias), se os poderes públicos se colocassem ao lado da lei e da vida. Mas isto talvez seja esperar demais de um país como o nosso e a chance de que ocorra possivelmente dependerá da pressão social em todos os níveis e órgãos do estado, como pede a boa prática democrática. Não por acaso, a própria Constituição do Brasil sabiamente reza, em seu artigo 225: 'Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e futuras gerações.'
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*Paulo de Tarso Barreto de Faria é Técnico
em Assuntos Educacionais do Ibama.

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